domingo, 25 de dezembro de 2022

Feliz Natal Papai Noel chegou

o descarrego gorou no país da desigualdade cordial

onde será caliente para todos a aurora austral 

havendo mil receitas com sugestões do chef  

para matar os excluídos da ceia de fome

porque panela vazia tem nome 

miséria pura mano  

e o trato da água tratada entrou pelo cano


que é isso companheiro está sem dinheiro 

junte-se aos milhões fora do sistema vigente 

filiados aos partidos ao meio 

engambelados com esmola há anos


cuidado o alarme disparou 

as lojas estão repletas 

o ano-novo não tarda 

vamos fugir deste lugar baby 

de marcha a ré pela garagem do subsolo 


domingo, 18 de dezembro de 2022

De amor ser tão carentes

não me surpreende o convívio entre nós tornado distância 

ele não veio de súbito foi uma conquista lenta 

fruto provável de nossos corações tão embrutecidos 


inserido na incerteza de meus próprios desacertos 

observo o rumo ruinoso em que tu te resvalas sem aprumo


olho a terra árida que nos cerca 

sinto o ar pesado que ofega o peito

e em mim cresce um sentimento de amargura e me pergunto 

como podem dois seres humanos de amor ser tão carentes

domingo, 11 de dezembro de 2022

Conselhos inúteis

como não se nasce outra vez 

embora haja quem diga talvez


cresce cheio de astúcia 

até ser chefe da súcia


amadureça cultivando prazer

pois débil é o fio condutor do viver


prioriza sempre aquilo que lhe convém

indiferente de tratar o outro com desdém


envelhece negando indignado a verdade 

transpondo as justas acusações com seriedade


sê feliz se puderes até quando

estiveres mineralmente transformado

e reste de ti quem sabe somente se tanto 

um simples retrato

 

domingo, 4 de dezembro de 2022

Quase poema meio prosaico

por que insistimos em vender gato por lebre

pergunto de mau humor caso tenha febre

e não tigre-de-bengala em lugar de canguru

ao atônito orangotango que me espreita nu

com olhos miúdos abertos a nova forma de ser

fruto de palpitações neuronais ávidas de saber

e aproveito para exibir gestos frios fingidos

entre centelhas crispantes de troncos rígidos


se eu ainda pudesse expor uma vasta cauda

ficaria o tempo todo com meu pelo eriçado

pondo pedra sobre pedra em poços de caldas

seria ouro sobre azul além de é claro gozado 


e depois quando tarde da noite estroina

perambularia pelos becos e as esquinas

da cidade renitente em admitir a derrota

até que a fadiga me levasse à bancarrota 

finalmente me fazendo sentir este deserto

que trago estampado no rosto recém-coberto

pela vergonha por ter percebido a mesquinhez infinita

da vaidade diante da magnitude de uma estrela extinta


a partir deste instante qualquer coisa chamada de alma

localizada em algum ponto do corpo cintilaria com calma

permitindo embora estrábico visse quase sem temeridade

aquilo que temos a pretensão de saber o que é a verdade

condição necessária não suficiente para dormir tranquilo

ainda que sonhasse eventualmente com areias movediças

o que dadas as atuais circunstâncias sociais disso e daquilo

representaria bem mais que benesse em meu tempo-espaço


e assim chego ao fim mirando no meio do urinol

de mais estas pobres divagações puro besteirol 


domingo, 27 de novembro de 2022

Como na pura poesia

verdade é melhor que mentira paz do que guerra

não como fazem falsos falantes e agentes do mal 

mas paz de verdade e verdade de fato 

demonstradas nas palavras e atos

respeitada a cadência das horas acompanhado o ritmo dos dias

escoradas na sinceridade verdade e paz que trazem alegria  

ou desnudam o desespero a miséria das gentes 

seus feitos bem feitos ou nem tanto 

e daí seus júbilos e arrependimentos 

seus amores e desamores para que se possa chegar ao fim sem temores

e se tal aprouver até dançar diante da morte à beira da cova 

e embora ali tudo termine em pó 

para quem acredite 

alimentar esperança de que algures conheça a eternidade  

longe das trevas lugar de purgação das almas perdidas 

ou nos confins de um vácuo insondável aprenda a ser nada

domingo, 20 de novembro de 2022

Agora já era

inútil então qualquer gemido

chegado o momento final

inútil então todo apelo repetido

pelo amparo de uma mão fraternal


inútil nessa hora pensar quem dera

ter vivido com dignidade

inútil pois inês é morta agora já era 

só resta o nada o vazio da eternidade

domingo, 13 de novembro de 2022

Do jeito que caminhamos

 da natureza o progresso destrói os pilares

com a desculpa de fazer o bem mas estas

boas ações degradam ar águas florestas

corriqueiramente e se tornam familiares


a maioria prossegue desatenta aos rumores

das vozes que alertam contra o mal da unidade

do poder do capital que vê claridade

só no dinheiro que se danem outras cores


qual mundo há de vir para uma futura criança

sem água potável restos de verdes ermos

só de flores de plástico sentir a fragrância


do jeito que caminhamos tais serão os termos

que chegaremos não adianta queimar incenso

porque o planeta vai virar um deserto imenso

domingo, 30 de outubro de 2022

Democracia pífia

 nesse negócio de tempos em tempos a chave do cofre muda de mão

todavia sempre vem a tiracolo o mesmo velho golpe  

fonte perene de alimento aos imensos privilégios autodecretados


entretanto tantas benesses que detêm não lhes bastam

exigem mais e com astúcia as conquistam

a multidão fora do esquema referenda a situação e... 


paga a conta  

domingo, 23 de outubro de 2022

Ciência não é sabedoria

 velhos tempos aqueles quando 

só se usava machado pra derrubar árvore

nos velórios havia mulher carpideira 

que por uns trocados chorava a partida do morto

sem falar nos madrigais tão magistrais

tempos que não voltam mais


salve 

oh raio que nos parta o bestunto

para entrar a fúria dos vendavais da ciência

e varrer a ignorância do mundo trazendo tanto progresso

inútil

pretender deter a civilização

domingo, 9 de outubro de 2022

Buraco fundo

 tá cada vez mais duro fazer milagre como antigamente

nesta cidade que invade a privacidade da gente 

que destrói privada pública vota no candidato errado 

e depois fica chorando sobre o leite derramado 

mas logo aparece advogado pra defender o salafrário

pois aqui todo mundo é inocente até prova em contrário

a podridão abunda e decência há anos foi pro ralo

todavia quem sou eu pra cantar de galo então me calo 

domingo, 2 de outubro de 2022

domingo, 25 de setembro de 2022

Antes tarde

ser eterno escravo do dever não permitir nenhum deslize 

nem em refúgio imaginário

cumprir todos os compromissos

atento ao menor desleixo

policiar com rigidez a vontade

assim é como manda a sociedade


se senhor dessas peias o sangue voltar às veias

com ele a coragem de tolerar alguma falha

mesmo que já seja meio tarde

descobrir não há hora pra liberdade

seria quem sabe um gesto de bravura

abonador da vida suas dores e agruras 

segunda-feira, 19 de setembro de 2022

domingo, 11 de setembro de 2022

Margemnais plácidos

 pela própria natureza um gigante

em pilhagem

povo domesticado avante

sob a ladroagem


é preciso ter talento

pra manter as fontes de moedas murmurantes

nos bolsos farsantes

em prudente movimento ora rápido ora lento 

domingo, 4 de setembro de 2022

sábado, 3 de setembro de 2022

domingo, 21 de agosto de 2022

A chave secreta

o tempo não traz o que ficou pra trás

olha ao redor nunca é tarde demais

linda a tarde que lentamente finda

sempre haverá resquício de luz ainda


sê aplicado apura tua louvação

cada momento vive em vibração


mas sem resistir aceita o declínio

inevitável destino é o não ser

sobre a morte não há nenhum poder

até o verme voraz tem seu fascínio


fato digno do nome verdadeiro

carece de palavras surdas-mudas:

somos cegos em trânsito por vias absurdas

e a chave secreta é ser somente inteiro


domingo, 14 de agosto de 2022

Bicho homem

tem o chão

e também tem o mar

no chão ainda coleia caracol

no mar ainda cresce colorido coral


tem o chão

e também tem o ar

no chão ainda viceja violeta

no ar ainda flana suave borboleta


tem o chão tem o mar tem o ar

no chão tem homem

no mar também

no ar idem


o homem no chão

ergue muito alto edifício

passa ponte não sonhada ontem

risca estrada asfaltada a perder de vista


o homem no mar

navega vorazes barcos pesqueiros

desloca imensos navios petroleiros

flutua cidades com luxo e lixo


o homem no ar

voa gigantes de alumínio e plástico rápidos e práticos

orbita satélites de todos os tipos

lança foguetes intergalácticos


o homem

no chão no mar no ar

prolifera progresso

distribui destroços 

domingo, 7 de agosto de 2022

Flecha do tempo

quanto tempo perdido

por temor de ser confundido

pelas tramas do coração

se tudo acaba em olvido

tendo ou não tendo sentido

quer se deseje ou não

se mesmo as coisas tangíveis

por menos se seja insensível

escorrem entre os dedos da mão

gozemos as horas não findas

pois delas ruinosas ou lindas

passadas nem resquícios ficarão

domingo, 17 de julho de 2022

Soneto do desconsolo

se este oco peito meu tivesse 

algum dia um contentamento

justo o primeiro pensamento 

quem sabe assim escrevesse

melhor fora se a mim ele não desse

 sem fazer tipo falaria de jeito isento

reconheço legítimo meu tormento 

não estranharíeis se assim dissesse

todos estamos a agruras sujeitos 

concordareis vós que acaso lerdes

a pesares e a infortúnios tão diversos 

resultado de nossos escabrosos defeitos

a menos que vós livres deles estiverdes 

nesse caso inútil o esforço destes versos

 

domingo, 10 de julho de 2022

Infância ferida por ouvidos moucos

o zum-zum-zum dos zilhões de veículos nas vias  

o tá-tá-tá da perfuratriz no asfalto  

        rua da igreja da Família Sagrada

defronte 

o bangue mal ouvido na vizinhança

        estampido no ouvido do padre acusado de pedofilia dentro da sacristia  

distante   

o sagrado silêncio nas catedrai

domingo, 26 de junho de 2022

Vou embora pro planalto

vou embora pro planalto

pra praticar assalto

sob as aparências da lei

e aí ter uma vida de rei


pra ficar muito bem blindado

nas artimanhas da contravenção

contratarei caríssimos advogados

que sabem de cor a constituição


no planalto não é preciso dar duro

porque é outra civilização 

lá tem processo seguro 

de partilhar a corrupção 


de suar a camisa fiquei até o pescoço

decidi agora ter um padrão de nobre

com muita grana fácil no bolso

fazendo de conta ser amigo de pobre


reuniões de terno caro e gravata

pra esquematizar maracutaias

conchavos bem producentes 

pra mim e pros meus parentes


carro de luxo do ano com motorista

guarda-costas e alto padrão de moradia

tudo de graça além de outras mordomias

minha meta é também gozar de tais conquistas  

 

desfrutarei a mamata que mereço

passarei a andar de salto alto

esquecendo os tempos de tropeço

já estou de malas prontas meu destino é o planalto


domingo, 12 de junho de 2022

Vida dissipada

espectro portando uma máscara com aspecto de rosto humano

se achando cheio de sagacidade abriga uma alma coberta de lama 

ser sórdido prepotente arrogante sob circunstâncias favoráveis 

fomentadas mediante ardilosas incursões 

amparadas no uso e abuso da dissimulação

aduba diligentemente o solo da indigência

cultiva o repúdio à probidade para colher benefícios egoístas 

exclusivismo que valoriza a imediatez e inviabiliza a equidade

caminha pela escuridão moral a passos largos sem precaução 

todavia frente aos enganos inevitavelmente surgidos em seu caminho

conta com a proteção de costumeira aliada

a plutocracia

poder maior da humanidade 

domingo, 5 de junho de 2022

Vitória verdadeira

vai nesta vivência

despistando como possa 

as piores desavenças

o azar cuspe na tosse

evita desnecessário atrito

é temente do destino 

não esquece o livre-arbítrio


perdido no meio da gentarada

a riqueza não discerniu sua presença

não sendo porém de não fazer nada 

de sol a sol suou a camisa desde menino

pra alcançar condição de viver decente

filhos diplomou como manda o figurino 

no frio dorme em cama quente 

no prato comida com sustança 

 

não esquece que um dia

já foi cão sem dono 

abrigado em enxovia

deitava no abandono

da enxerga em que chovia

disfarçava a fome avara

catando papel pelos lixos da cidade

sorriso permanente pregado à cara

logrou se aprumar já com certa idade

sem antes contudo

em ponta de faca dar muito murro  


domingo, 29 de maio de 2022

Vaidade tudo vaidade

não há sabão bastante pra lavar toda esta imensa sujeira
que entretém o noticiário diário sobre esta fina gentalha 
que translucidamente não larga do poder nem a porrada 

isso não é coisa passageira é inerente à humana natureza 
ser amiga fervorosa até os ossos da vaidade e da riqueza 
porque aquilo que conta é a grana pois com ela tudo tá bacana 
quanto ao povão na precisão que tome no redondinho quietinho
isso ninguém há de contestar nem criança em idade pré-escolar
se alguém pretender fazê-lo vai parecer que está fora do ar 

por exemplo quando fico aqui dando panca de lúcido
jogando fora palavras inúteis pela brisa mal arrastadas 
bocó acho que sei o que se passa com a desgraça alheia 
escondido em falsa compaixão que o coração aligeira
nítido no duro tudo aceito e no conforto me esgueiro 

domingo, 1 de maio de 2022

Se um dia

emergisse da tortuosa tarefa
imposta por mim a mim mesmo
deliberadamente talvez
sem compreender bem por quê
de pretender com voz roufenha
cantarolar as inglórias vitórias
e derrotas retumbantes
que vi vivi sofri impus 
exultei lastimei inventei supus 
fui cúmplice voluntário arrastado 
pela vida afora

falsamente despreocupado
com o silêncio mundano diante dela
por lhe arrogar valor inerente por definição 
soberba autoestima vanglória ridícula 
convencido da ignara alheia incompreensão
vacilante frente a algum aplauso ocasional
buscando consolo em chã  filosofia  
fugaz é o estrépito dos fogos de artifício
flébil o alarido saído das vielas da vaidade
frouxas ideias disponíveis ao rompimento
pronto para entrar no mercado de ilusões

e gritasse sem hesitação 
com toda a força dos pulmões
a cara transbordante de raiva
lavada pelo choro da amargura
basta não faço mais nada disto
chega de tanta inutilidade desisto
não vou mais esbanjar meu tempo
ele é curto precioso
aqui e alhures agora e depois
vou atrás de novas distrações
continuar às moscas mas
decididamente consciente
na medida do possível 

essa atitude a ninguém comoveria nem deveria
afinal de contas as pessoas de bem têm 
contas mais importantes para dar conta
e as de mal têm de cuidar dos seus bens
em lugar de atentar pras lamúrias de um desocupado

destarte continuo imergido nas ruínas 
de meus castelos de areia
adornados com jardins de escória
onde floresce na primavera a doce melancolia
e no rigor invernoso a amargosa alegria
o olhar cada vez mais enevoado 
o pensamento cada vez mais embotado
nos gestos lentidão beirando o insuportável
na curvatura da espinha bem pra lá de madura
o desenho de um contorno inconfundível
suporte da vestimenta da morte
derradeiro presente da vida

solitário vou moldando o vazio com nada
a espera do dia em que tudo isto afinal
definitivamente acabe

segunda-feira, 25 de abril de 2022

Pane no gps

era uma tarde azul de primavera fecunda
em sua órbita o satélite tirava fotografia
da terra a intervalos regulares de 1 s

pela estradinha que serpenteava a encosta
o menino franzino ia descalço assobiando
carregava a colheita do dia de erva nas costas 
a quantidade até que fora razoável mas
estava longe dos tempos áureos do avô 
que
não precisava ter fugido com a amante do padre 
não precisava 
bastava continuar fingir
qualquer pessoa tanto de bom quanto de mau
senso está cansada de saber que tudo isso é falso
exceto carregar pedras pro alto do morro 
pra deixá-las depois rolar morro abaixo 
fá-lo a sério
compromisso diário o homem feito de otário
por aqueles que carregam a cruz como credo
dos tolos que não ligam se lhes enfiam espinhos
da cabeça aos pés inclusive no rabo e os deixam 
cobertos com um mísero trapo que mal esconde
as partes pudendas igual ao que usam 
nos quadros de debret sem pai para lhes orientar
as crianças bem depressa tomam conta do pedaço
porém é preciso não exagerar no rigor são as duas
faces da mesma moeda velho e desgastado dinheiro
que dele todo indivíduo mais dia menos dia faz uso
por mais estúpida
e feia
tenha sido sua passagem por este mundo

mãe também deve dar orientação principalmente
sendo uma mulher centrada e sensata
tendo vindo de onde quer que seja
até mesmo se nascera em berço de ouro ou de prata
com todo o respeito devido como se dizia antigamente
é uma simples questão de bondade sem caridade

entrementes quando o sujeito não dorme
satisfeito ao acordar o pensamento passa a voar
pelos lugares mais esdrúxulos sem registro na caixa
preta cerebral afinal ninguém é de ferro e mesmo
que fosse enferrujaria não ria o ser humano
jamais conseguiria ficar eternamente
em estado de vigília necessita de um terceiro
que lhe renda após certo período máximo sem ter pregado
os olhos ainda que seja um empregado modelo
uma vez que depois desse tempo por mais exemplar ele fosse
haveria risco concreto de que mandasse tudo pro raio que o parta

foi o que certa feita sucedeu comigo e um amigo
conto contudo lhes encareço não ser alvo de riso
pois me considero um sujeito direito talvez 
ciente de que água e óleo são praticamente
imiscíveis que gosta e respeita as flores
embora inúmeras vezes tenha dado com os burros
n’água e pra comer a polpa da fruta teve que engolir
também o caroço sem dar um pio quem dera gritar
para subserviente atender os desejos como gostam
seus superiores de graça
sem reclamar nem olhar para trás atrás
de um olhar acalentador seguindo sem parar pelas estradas
esburacadas da vida visto o costume de carregar água em bilhas
agora é raro como mulheres sair com saias abaixo dos joelhos

domingo, 17 de abril de 2022

Liberdade faz de conta

nós miríades de viventes anônimos misturados 

em atitudes de virtude e louvores amiúde

acobertando intenções inconfessáveis

somos arrastados num redemunho de vida 

que incessantemente quer superar-se a si própria

desse turbilhão terceiros se tornam senhores de boa parte do destino dos demais

decorrência dos medos interesses comodismo ignorância impotência dos restantes

como consequência tais terceiros com seus mandatos cargos atribuições 

em governos conglomerados empresas organizações

se transformam em autoridades muito poderosas protegidas e privilegiadas

e muitas vezes enroladas na bandeira da democracia e legalidade

conseguem ardilosamente engendrar em nós simples mortais

uma ilusão de liberdade que nos leva a uma servidão sub-reptícia 

na qual sem perceber nos tornamos escravos de nós mesmos

e ignaros alienados e às vezes até felizes passamos a portar arreios

uns poucos de ouro a maioria de couro

atrelados às carruagens desses donos do poder

e tangidos pelo chicote sutil de seus asseclas 


domingo, 10 de abril de 2022

Progresso automotivo

a fumaça que sai 

do escapamento do carro

provoca poluição 

do ar que vai 

pro nosso pulmão 

deixando ele cheio de catarro


eta fumaça careta

vai pra cima direto 

e de noite como um véu

esconde as estrelas do céu


o progresso automotivo

representa um alto motivo

prum soberbo desenvolvimento

mais uma fonte de forte tormento 


domingo, 3 de abril de 2022

Uns cagões

por que todo este ti-ti-ti 

sobre poluição do tietê

se nossa cara espécie

humana por definição 

nasceu pra cagar consistente

inteiro para o meio ambiente


basta lembrar apenas 

que há dois mil anos

já um milhão de ânus

romanos soltavam suas 

fezes patrícias plebeias

escravas e mercenárias

direto na cloaca magna

que as conduzia ao tibre

para que fossem diluídas 

no majestoso mediterrâneo


hoje somos mais de doze

milhões de paulistanos a 

fazer o cocô nosso de cada dia

do qual uma parcela substancial

navega pelas águas do rio morto

nauseantes em busca de um porto

esforço empestante do ar capital


se tanto ontem quanto agora

aqui e ali cá e acolá tem sido assim 

pensar em solução 

pro problema é pobre ilusão

pura poesia possível só em cuca dura ou vazia 

pois sempre fomos somos e seremos uns cagões


domingo, 27 de março de 2022

Tudo como dantes

não deixariam ainda que fosse o ato derradeiro

escapar a oportunidade com que tanto sonharam 

matilha de lobos em pele de cordeiro arrombaram

o erário salafrários metendo a mão no nosso dinheiro


política podre pra preservação da memória

do país aprendiz de gente grande no engano

permanente vai vivendo entra ano sai ano

continua sempre a mesma velha história


pro poder privilégio sobe pro povinho desce

o salário miudinho quem tem bens é bem cuidado

quem não tem só se dá mal persevera desgastado


um ou outro com bom senso inocente reconhece

tanta injustiça não pode ser um estado eterno

enquanto a novela dá refresco a este inferno


domingo, 20 de março de 2022

Turísticas ondas

o melhor pedaço deste convívio é a solidão

que chega de manso espontânea na vastidão

do bulício de gente perita em pôr os pés na terra

transformando água de beber em coisa rara e cara 


foi fechada a janela de onde se via nesga de horizonte

abandonadas sobre as turísticas ondas mediterrâneas 

hordas famélicas finalmente alcançam as margens

tão cobiçadas para gozar o sossego da vida eterna 


com alma leve coração aberto e barriga cheia 

bem repousados despertam de sono profundo

bastiões do bem para fingir solver a inquietação


que perpassa pelos jardins públicos visitados por

 mendigos enquanto nas bicas das boas quintas

corre precioso vinho para o resto fica o silêncio

domingo, 13 de março de 2022

Tirando da reta

rapsodo de poemas incompreendidos

de voz rouca confundida com latidos

emitidos madrugada alta por cachorro 

abandonado na rua pedindo socorro


pobre bardo das estrofes disformes

acumula problemas mentais enormes

quisera lhe oferecer parecer discreto

esforça pra não ser idiota tão completo


os mais aptos é que permanecem vivos

graças a fortuitos processos seletivos

agindo em primitivos elementares

surgidos no seio dos remotos mares


gerando diversas classes de parasita

dentre as quais uma comum e esquisita

é a dos políticos com imunidade a abalos

sofrendo eventualmente pequenos estalos


se destacam também outros tipos

com bem marcados fenótipos

caracterizados pelo crônico atraso

social mas aqui não se trata o caso


essa quiçá represente uma maneira ingrata

de abortar o assunto entrementes o que não mata

fere e o estulto vate já cometeu muito desatino

todavia nada há a fazer contra a força do destino


domingo, 6 de março de 2022

Temporal urbano

ontem de tarde caiu uma tempestade com muita trovoada

a chuva corria pelas encostas do morro vizinho de casa

arrastava além de lama montes de entulho da enorme favela


ali instalada há anos acostumado à cena olhava da alta janela

de vidro fechada impedido por ora que estava de sacudir a toalha

de mesa distraído sem a mínima pressa de ficar livre das migalhas

do almoço na cozinha a esposa produzia barulho típico de lavação 

de louça meio abafado pelo chiado do vento pela frincha da porta

da sala lá embaixo os caminhos estavam completamente alagados


relâmpagos não cessavam de clarear o céu precocemente escurecido

riscavam o espaço coalhado de gotas pendentes de nuvens compactas

um homem calvo gritava por socorro com a cabeça para fora do carro

arrastado pela correnteza na direção do canal assoreado pelo medo

totalmente tomada fato compreensível se pôs a rezar em alta voz 

a tia coroca paralítica faz bastante tempo moradora junto de nós 


ela é devota de santo expedito mas naquele instante apelou pra santa

padroeira do temporal talvez por que esperasse que seu pedido

fosse julgado sem burocracia com aprovação bem mais expedita

do alvará de proteção daquele ambiente familiar e caseiro

com tranquilidade aguardava que o aguaceiro tivesse passado

agora observando o muro do quintal ao lado todo pichado

pensava nada mais justa reivindicação para pessoa de sentimentos

bons incapaz de fazer mal a uma flor visitada por mamangaba


podia afiançar aquele sentir como pio em plenitude 

cria coberta da mais pura dignidade tal atitude

por isso provavelmente a santa bárbara

não abandonaria gente civilizada tão rara

 

domingo, 27 de fevereiro de 2022

Solidão

no gozo de plena decrepitude 

acha-se perdido num labirinto imaginário 

que derrapa na curvatura obscura do espaço tempo

estático porém na concretude do cubículo  

com a complexidade geométrica de um ovo 

não repara que o velho espelho na parede defronte   

não reflete mais o mesmo rosto de agora há pouco 

sempre sobreposto à inescrutável alma solitária 

máscara que a monotonia cotidiana lavra

o burburinho da rua lá embaixo acompanhado 

de mosquitos invadem pela janela o aposento único  

entrementes observa indiferente

a tarde que vai tarde 

além daquela porta

ninguém esquecerá o que nunca foi

lembrado em tantos anos acumulado 

logo a lâmpada elétrica dará

olhos à noite que se aproxima

no minúsculo retângulo  

palco da patética épica

do utópico planeta ridículo 

inventado em sonhos loucos  

lugares onde jamais pisaram pés humanos

a penumbra que cai sobre a cidade

também penetra pouco a pouco 

ninguém se surpreenderá 

na hipótese remota de olhar 

se não enxergar nenhuma estrela no céu


domingo, 20 de fevereiro de 2022

Sodalício ilícito

podem crer companheiras e companheiros

a questão não era só meter a mão no dinheiro 

a intenção era na verdade das melhores

pena que nas profundas inferiores 

tem um montão de intenções boas

penando o tempo inteiro


o desejo era ter o poder 

pra poder fazer o bem

geral e em particular  

pro povão torcedor do timão 


sabe como é né

o corporativismo crônico 

que sempre imperou no país

desde os tempos imperiais 

nunca esteve nem aí 

pro tal bem geral e os desvalidos

coitados sempre estiveram fodidos


a turma que fica por cima da carne seca

só quer saber de olhar pro próprio umbigo

que se dane se o grosso da população leva a breca

na hora da eleição engoda o povo chamando de amigo

depois da eleição engorda inda mais o patrimônio antigo


se ralou pra chuchu no início na moral

no meio do caminho já tinha mau sinal

mas afinal veio a conquista do poder central

foi um longo e duro percurso de muita luta

não é mole enfrentar a plutocracia filha-da-puta


quando finalmente se conseguiu chegar lá

se dissipou o medo de não haver felicidade

cresceu a esperança de menos desigualdade

todos querendo cantar contentes o lá-lá-lá  


mas a cambada deputada como sói acontecer

pretendeu emperrar o processo doa a quem doer

ameaçou colocar areia quer barganhar o poder  

e aí se cometeu o erro que pôs a honra a perder


aproveitando o conceito de minério duto

vindo das gerais montou-se um valério duto

na capital federal capaz de garantir aprovação

de todo decreto considerado bom para a nação


mas se a votação já está previamente acertada

ela não resulta de salutar debate ela é viciada

e se for projeto maroto de interesse particular

a coisa começa feder esgoto é muito irregular


a ironia é que se lutou tanto pela democracia

muitos até com a vida pra acabar com a ditadura

pra haver liberdade fundada em leis de verdade

e depois se cospe na constituição na maior cara dura


a ação criminosa veio à tona

por conta de uma defecção 

que provocou a maior zona

entre os membros do esquemão


o correspondente membro defecante

exigia os 16 milhões prometidos

caso contrário botaria a boca no trombone

mas a chefia do bando insistia em tapar os ouvidos

jogada a merda no ventilador

foi um deus nos acuda meu senhor

e um belo magote de gente importante 

não teve jeito foi levada a julgamento


o tribunal maior analisou em detalhe os fatos 

e pondo o preto no branco com autonomia

julgou a maioria dos réus arrolados culpados

engrandecendo sobremodo a nossa democracia


pra resumir todo o triste enguiço

desse escabroso ilícito sodalício

podemos dizer num pouco palavrar

face ao mal do qual é bom se livrar


o que era um grande partido fonte de esperança

virou um partido grande caído na intemperança

e que fique mais uma vez muito bem clara a lição 

de que devemos abominar toda forma de corrupção 





domingo, 13 de fevereiro de 2022

Só de passagem

quis aos quatro ventos espalhar meu canto

tentar separar joio do trigo criteriosamente

porém tenho de admitir não posso mentir

parece que tudo deve ter saído ao contrário

escrever bem além de outras aptidões a mais

requer do escritor em particular dons naturais

para perceber aquilo que de fato merece ser

um texto e com ele muitos venham a concordar

ou não adianta falar que o mundo está doente

se ele é assumido são por um montão de gente

senão é chover no serrado levar colher de sal ao mar

sinto ter de dizê-lo tamanho é meu zelo em sê-lo 

que minha saúde anda pior que a do mundo afinal 

somos da mesma natureza destarte talvez natural 

que assim seja amém mais ou menos criatura tão 

cheia da vida alimentando ideias quiçá negativas

atrativas de polaridade oposta isto é coisas positivas

ainda bem que há tantas e tantas outras canções

capazes de falar de amor encantando corações

cardiopatas metem a boca na pasta e vai-se a paisagem

vira carvão e pasto como eu que estou só de passagem 

 

domingo, 6 de fevereiro de 2022

Sinceramente

antes fosse um ser firme e sincero

mas frente à menor ameaça desespero

sou mesmo um cara fraco um babaca

sem coragem pra chutar o pau da barraca


se o assunto é tal do qual discordo

ouço calado indagado contorno 

rodeio tergiverso com receio 

de não agradar então concordo


no espelho do banheiro

procuro marcas no rosto

em vez de olhar por inteiro

fundo na fonte do desgosto


dentro de mim um motor ligado no não

fora colo na cara a máscara do sim

faço de conta que sou assim

na rua me misturo à multidão

 

domingo, 30 de janeiro de 2022

Presto

necessitava de inspiração
para encontrar a invenção
da palavra certeira
seta
sopro de um vento 
libertador 
alento 
que faz tudo parecer saudável
ao fazer tudo correr
em miríades de pés de vento
mensageiros do escárnio necessário
para atravessar os pântanos tantos
de um mundo enfermo e ruim 
portador da propriedade de 
jamais poder ser 
compreendido em profundidade
e onde o reinado do perdão 
carece de impossível transfiguração 
e talvez seja um pouco tardio
querer refletir sobre eventuais
melhores maneiras 
de suportar a vida
no leito de morte

domingo, 23 de janeiro de 2022

Poema peculiar

Pé na estrada gente urgente pra outro planeta mais cedo
Cu quem tem tem medo
Li foi em algum lugar
Ar tal qual água está pra acabar

domingo, 16 de janeiro de 2022

Pintinho no ninho

era uma vez

um pintinho preguiçoso

que passava o tempo todo

dormindo em cima de um 

saco velho amarfanhado


não havia jeito 

do pintinho querer sair

daquele ninho malfeito


todo dia bem cedo porém

sem mais nem menos

aparecia por ali na cama 

uma fada madrinha

muito da boazinha que

com sua varinha encantada

plim

batia bem no meio da 

cabecinha do vagaroso


o pintinho pachorrento

na mesma hora acordava

abria os olhinhos remelentos

espreguiçava sem pressa alguma

ia meio matreiro até o banheiro

erguia a tampa da privada e dava uma

bela e sonora mijada


depois voltava pro seu remanso

continuando a repousar aconchegado 

em cima do saco velho amarfanhado

sem se preocupar com mais nada


e assim terminou esta história sem graça

do pintinho preguiçoso porém boa-praça pois 

ao urinar não esquece

de levantar a tampa da privada

 

domingo, 9 de janeiro de 2022

Serena serenata ao sereno

cansei de cantar tanta canção

insistindo em apontar apuros 

meu pulmão

quando assim expira aparenta soar desatino puro

doravante vou cultivar videira

produzir só vinho de primeira

predileção perene apenas por casta nobre

esmagada com os pés em tina de cobre

deitado na taça 

não bruto mas com graça

nele o olvido seja ledo 

ao destino cedo

sei não saber ser infenso ou avesso ao cantar meus ais 

mormente banais

versejo chinfrim 

uma rosca sem-fim

vinicultura há de me dar algum tino na tina enfim

aproveito a oportunidade pra declarar

que finalmente estou aprendendo amar

minha professora não uma pessoa qualquer

mas uma senhora mulher

mandei até fazer uma nova dentadura

perfeita dama clareou minha vida escura

meu sal na medida certa

adeus horas incertas

debaixo da sua janela pra ela farei serenata 

com sanfona violão violino e fagote


domingo, 2 de janeiro de 2022

Fairwell melancholic new year

                e vem uma insana ânsia de querer discorrer sobre tão frágil matéria cujo destino é definhar e morrer quando na verdade a vontade deveria ser açoitar o espírito comprimido pelas curtas arestas das paredes deste quarto para ir em sentido oposto

                por ora abrandou o tumulto de ontem mas nos ouvidos ainda ecoam os uivos da multidão desesperada atrás de destroços para consumir a qualquer preço e depois viajar e depois se amontoar e de novo consumir e retornar de onde partiu 

                o mal está em toda parte e diante dele nos vergamos com um desejo irrefreado de cingi-lo apertado nos braços e a ele oferendar flores porém momentaneamente exibimos na cara um arremedo de fraternidade porque  

                ao bem somos naturalmente hostis 

                e no transcorrer das horas dos dias dos meses enveredamos por convulsas vias formando nossos bandos estreitos e com isso da essência da vida deixamos que sequem as raízes