domingo, 26 de abril de 2020

O estranho

a maioria de nós somos pessoas desamigas
podemos até falar a mesma língua mas não
nos entendemos via de regra nossa relação é
meramente formal para relatar nossos triunfos
alcançados e o quanto merecemos conquistar
afortunados temos casa raramente dita um lar
com nosso próprio umbigo costumamos sonhar
os semelhantes tratamos como se estrangeiros
a certa distância com educação em caso ideal
eu mesmo sou um bom exemplo dessa patifaria
eu que se tanto vou deixar coisa pior por biografia

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Mudança de forma

desde então
não quis mais nada
fui apenas cinza fresca
de início
misturada à terra antiga
desde tempos
coberta de mato pobre talvez urtiga
de vez em quando
cheirando o molhado vindo
a reboque de passageira chuva
num fim de tarde
de um verão sem data
outras vezes
de madrugada
baixo um céu de luz escassa
arrepiada
por brisa quase nervosa
de rumo incerto

domingo, 12 de abril de 2020

O bicho pega e come

o anoitecer vai se achegando suavemente no apartamento
pela porta da varanda  espalhando penumbra no ambiente
logo mais tarde graves acontecimentos estarão presentes
nos pesadelos invasores de cada dormente pensamento
íncubos e súcubos vindos de vários cantos do universo
em prosa e verso apontarão o perigo antigo que prestes
miserável estou para cair se é que na verdade já não cai
velhas histórias repetidas não é de hoje desde priscas
eras por incrível que possa parecer antes até do tempo
que havia reis rainhas e corriola com baita mordomia
guerras claro havia entretanto um dia vão acabar com
o fim do mundo era o destino de variados comércios
ilegais há muito viabilizados por terra por mar e ar
com a falta generalizada de pudor o fedor se espalha
por todos os recantos do país do carnaval onde floresce
sem precisar de adubo podridão por favor apague a luz
o último que sair para escalar montes desbravar vales
ao retornar corre o risco de dar de cara nos muros que
servem pra isolar a parte nobre da periferia onde adormece
dentro de um dos milhares de barracos da favela maristela
doméstica desempregada avança na madrugada lentamente
no terreiro de chão batido culminando o ritual o pai de
santo seminu tira a pistola pra fora e pum outra bala
perdida dorme alojada pra sempre na cabeça de criança
outra nem tão inocente acorda no além nova lambança
da vida a última fim dos sonhos de se tornar famoso
traficante favas contadas pra esticar as pernas
em cima de uma cama dura de aço inoxidável
em concorrido recinto público onde as palmas
por mais fortes sejam não desperta do sono
profundo a pessoa aí enviada pra ver se morreu
de fato neste caso de quê ou se não teve pequeno
engano outra vez me pega pela mão por gentileza
e me leva pra tua casa
me sinto deveras cansado
quero cair numa cama macia
caso ainda tenhas disponibilidade
podemos tornar ao assunto de início
abortado ontem ao deitar brincar
de papai e mamãe embora de dia
durante a semana não tenho hábito sabes
bem como é essa história acredito
se recusares tudo bem não te tiro a razão
sei perfeitamente penso eu acho que verdadeira
é tua motivação de acordo com que os filósofos
pré-pitagóricos ensinam quem sabe

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Mesquinhez infinda

dentro do infinito
um espaço restrito
nosso universo quase sem fim
do big bang até um num sei quando
todo ele formado por particulares
partículas em movimento eterno
particularizado pelo nome de tempo
num campo de energia
aparentemente parecendo nada
fonte e sumidouro das referidas partículas

muito menos que um pum de pulga anã
perdido nessa incomensurável imensidão
fadado quiçá há mais completa universal solidão
gravita um montículo de terra
cercado por água e por ar
denominado de planeta terra

é aí ou melhor aqui que eu demoro
gravitando solidariamente com ela
repleto de inúteis expectativas
num corre-corre incessante
num lufa-lufa extenuante
boçalizado por banalidades
acompanhado de ansiedade
com meus graves problemas
os mais recentes e os antigos
pois olhando pro meu umbigo
é assim que eu os considero

quem discordar desta merda
que castigue a primeira pedra
quanto a mim chega de lero-lero
por ora ficar em casa é o que quero

quando todo esse pandemônio acalmar
caso consiga do maldito bicho escapar
retomarei minha rotina pleno de patifarias
como sempre metido em mesquinharias