domingo, 6 de março de 2022

Temporal urbano

ontem de tarde caiu uma tempestade com muita trovoada

a chuva corria pelas encostas do morro vizinho de casa

arrastava além de lama montes de entulho da enorme favela


ali instalada há anos acostumado à cena olhava da alta janela

de vidro fechada impedido por ora que estava de sacudir a toalha

de mesa distraído sem a mínima pressa de ficar livre das migalhas

do almoço na cozinha a esposa produzia barulho típico de lavação 

de louça meio abafado pelo chiado do vento pela frincha da porta

da sala lá embaixo os caminhos estavam completamente alagados


relâmpagos não cessavam de clarear o céu precocemente escurecido

riscavam o espaço coalhado de gotas pendentes de nuvens compactas

um homem calvo gritava por socorro com a cabeça para fora do carro

arrastado pela correnteza na direção do canal assoreado pelo medo

totalmente tomada fato compreensível se pôs a rezar em alta voz 

a tia coroca paralítica faz bastante tempo moradora junto de nós 


ela é devota de santo expedito mas naquele instante apelou pra santa

padroeira do temporal talvez por que esperasse que seu pedido

fosse julgado sem burocracia com aprovação bem mais expedita

do alvará de proteção daquele ambiente familiar e caseiro

com tranquilidade aguardava que o aguaceiro tivesse passado

agora observando o muro do quintal ao lado todo pichado

pensava nada mais justa reivindicação para pessoa de sentimentos

bons incapaz de fazer mal a uma flor visitada por mamangaba


podia afiançar aquele sentir como pio em plenitude 

cria coberta da mais pura dignidade tal atitude

por isso provavelmente a santa bárbara

não abandonaria gente civilizada tão rara

 

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