domingo, 18 de abril de 2021

Poema do gato vivo

o poetinha

como costumava ser

carinhosamente chamado

o poeta maior

diplomata de carreira

artista das letras e da música

cantor do amor

encantador de mulheres 

certa feita

em florença

nos idos de mil novecentos e sessenta

escreveu um encômio 

aos felinos domésticos

que denominou de 

soneto do gato morto


entre tantas coisas belas 

como soeu acontecer

com quase tudo que ele escreveu 

naquele particular poema está dito que

um gato vivo é qualquer coisa linda

nada existe com mais serenidade


ora pois

não é que um dia desses

por conta do meu aniversário 

de quem eu considerava 

uma pessoa amiga

ganhei de presente um gato


passemos sem delongas aos fatos

o tal bichano de fato

acorde a opinião do bardo 

sem dúvida era portador

de uma invulgar beleza 

serenidade porém nem pensar

sua educação deixava muito a desejar

sofá poltrona cadeira mesa

o sacana subia sem pestanejar 

quando bem lhe desse na telha

para refestelado ali se aboletar

carpetes e tapetes

além das almofadas de finos tecidos

eram os lugares por ele escolhidos 

para praticar a arte de arranhar

saltava sobre a pia da cozinha e ali

comia o que havia de seu agrado

o restante largava tudo bagunçado

diariamente dava um repasse na fruteira

que ficava em cima da geladeira

rasgava os pacotes de bolacha e de chocolate

ainda dentro do prazo de validade 

guardados na prateleira do armário

era mesmo um bichinho salafrário

espalhava papel higiênico o limpo e o usado

pelo chão do banheiro

eta gatinho abusado

entrava no roupeiro para afiar as unhas

em minhas camisas de seda preferidas

pisoteava delicadamente 

com as patinhas sujas de barro

meus papéis em cima da escrivaninha 

achava sempre um jeito 

de dar uma escapadela

pela porta ou pela janela

e voltava na manhã seguinte 

com a fuça estropiada se fazendo de doente

dormia o dia inteiro acordava no fim da tarde

reclamava da ração miando desesperado o patife

parava só depois de receber um bom naco de bife

pra completar meu desespero

enchia todos os cantos de pelo


as palavras do renomado vate

bem se aplicavam aquele meu gato 

o danado era um disparate

mesmo parado ele caminhava

e parecia que estava sempre rindo da minha cara


pra concluir esta baboseira

deixo aqui registrada

uma confissão derradeira

não consegui suportar a situação

e tive que me livrar do animal

dando ele também de presente

para um parente meio distante 

um cara considerado muito legal

foi a forma que encontrei 

de manter o maldito gato vivo 

sem que eu não enlouquecesse 

e quem sabe até morresse

porque pra falar com franqueza

era ele ou eu aqui nesta casa

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