domingo, 30 de junho de 2024

Ser humano

 bom seria se ao bem não houvesse tardança

porém com verdadeiro sentimento

se viveria em um real contentamento

privilégio que tão só um ou outro alcança

se gozaria da plena segurança

de não receber nem causar tormento

nem que fosse por mero esquecimento

pois estaria o bem sempre na lembrança


talvez gostemos que outros se entristeçam

ou com nossa dor eles se contentem

e daí do bem todos logo se esqueçam

pouco se importando que se atormentem

e o nome de desumanos não desmereçam

posto que desamor é o que mais sentem


porém fraca é a dor repartida com a dor alheia

domingo, 23 de junho de 2024

Sonho meu

acostumei com meu destino de roer osso

atolado em dívidas acima do pescoço

se tivesse florescido numa família distinta

qual o que isso é espécie há muito extinta


continuarei a curtir minhas horas áridas

não me resta mais nada não tenho guarida

estou enjoado de estudar mitologia


quero partir pra coisas mais arejadas

deixar o estigma de desvendar enigmas

as ideias sempre povoadas de monstros


quero coisas mais simples pra pensar

deitar de noite na cama sem precisar

de luz acessa pra poder dormir


não vou persistir no erro crasso

de viver deste modo aéreo arre

insistindo acreditar em milagre


a partir de agora vou ficar na flauta

deixar o tempo rolar eis minha pauta

empregado permanentemente na caixa

não saio mais dessa só salário na faixa


domingo, 16 de junho de 2024

O poema

o poema que pousa diante dos olhos 

é um pássaro vindo de alhures 

talvez trazendo no bico um augúrio

ou alguma espécie de outro alimento 

se ignorado ele alça voo como se ali fosse um galho ao relento

vai à procura de outro pouso ver se tem um instante de atenção 

e pode ter sido perdido o encanto da ocasião de mergulhar no espanto 

de saber que o alimento que ele oferecia

talvez amenizasse um pouco uma agonia 

talvez desse algum alento a uma estreita alegria


ou por mero acaso então, 

o gesto de ignorá-lo evitou que se ingerisse algo indigesto 


por que não? 

domingo, 9 de junho de 2024

Nudez sem castigo

nudez sem vergonha agora 

sob o lençol de algodão barato

indiferente às manchas de sangue tingindo o tecido


mais tarde cheira mal com traje social 

em lugar restrito nem janela nem porta

desnecessária a presença do sol 


depois um montículo seco

razoável acúmulo de pó

 e outros detritos por cima


em linhas gerais 

o destino da defunta nudez  

antes viva cheia de altivez


domingo, 2 de junho de 2024

Fusão nuclear

o pesadelo da poluição oprime a terra cinzenta

cada vez mais e mais a cada instante que passa


tudo sucumbe à força bruta e voraz do mercado

que embaça nossas cabeças escraviza nossas vontades


lobos em pele de vison afetam inocência e brandura

protegidos de seus pecados sob densa cortina de grana


e o sol segue seu curso no céu convertendo hidrogênio em hélio

indiferente a santos e pecadores se o mundo está virando bagaço