segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Palavras e coisas

 manoel de barros poeta maior 

entendedor de tudo sobre o nada

arauto de sábias ignorãnças  

das grandezas do ínfimo 

num de seus inspirados poemas rupestres  

diz sofrer um encantamento poético

ao olhar a garça-ave e a palavra garça

embalado que fica pela comunhão

do corpo níveo da ave 

em seu voo elegante e livre 

sobre as ainda lindezas do pantanal 

com o corpo sônico da palavra

em sua intrínseca beleza letral


eu eduardo poetastro menor 

bisbilhoteiro de nada se tanto 

neste poemículo citadino me atrevo a pisar  

ao avesso as pegadas poéticas de mestre manoel 

pra dizer que sofro um desencanto profundo

ao ver o estado da pomba-ave nesta cidade

e ler a palavra pomba no dicionário

perturbado que fico pela dissonância

entre o corpo físico imundo da ave 

e o corpo sônico harmônico da palavra


ave símbolo da paz e da pureza

na metrópole moderna se metamorfoseou em rato alado

e se imiscui sem cerimônia por todos os lados

domina o espaço de outros pássaros

caminha atrevidamente pelas calçadas e praças

ciscando lixo em busca frenética por alimento 

aboleta-se em árvores postes monumentos telhados 

defecando procriando espalhando piolhos fungos bactérias

dando com sua presença predatória 

à maioria das cidades do mundo 

valiosa cota de contribuição para a degradação 

da qualidade de vida e do meio ambiente urbano

degradação que vem na cola  

ao que se convencionou chamar de progresso 

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